sexta-feira, 1 de maio de 2009

Lawrence Lessig

- Qual a influência da tecnologia na cultura do século XXI? Lawrence Lessig - Na metade do século passado, quando inventaram o gravador, um cantor americano foi a público falar que aquilo era um perigo, que ia estragar as apresentações de canto ao vivo. Ele disse que nossas cordas vocais atrofiariam, assim como perdemos nossas caudas quando nossos ancestrais hominídeos desceram das árvores há milhões de anos. De certa forma, ele tinha razão. O século XX foi dominado por um consumo passivo de cultura. A imagem clássica é uma pessoa vendo TV no sofá. Agora, a tecnologia nos deu a chance de sermos criadores. (Lessig tinha acabado de ouvir a apresentação de um estudo segundo o qual 10 milhões de americanos se consideram artistas.) O problema é que as leis foram feitas com um cenário dominado por meia dúzia de grandes indústrias de cultura. Agora temos de fazer legislações adequadas a um mundo em que todos produzimos bens culturais. - Como mudar as leis? O caminho é político? Lessig - Seria um erro de estratégia. Os congressistas americanos não estão conseguindo compreender as mudanças trazidas pela tecnologia. Se tentássemos fazer pressão sobre os políticos de Washington, até conseguiríamos levantar o debate. Mas ao final os políticos cederiam aos interesses tradicionais de Hollywood. Nosso desafio é criar uma comunidade internacional que use e aprove a nova versão de propriedade intelectual que chamamos Creative Commons. É o que está acontecendo no Brasil. - Por que no Brasil? Lessig - Vocês no Brasil têm uma oportunidade excelente. É um privilégio contar com a liderança de alguém como o ministro Gilberto Gil no Ministério da Cultura. Ele está incentivando a adoção do Creative Commons. Assim como é ótimo ter no país gente que entendeu a importância do software livre. O fato de artistas brasileiros lançarem seus discos dentro de conceitos mais flexíveis de propriedade intelectual vai permitir que a música brasileira ganhe oportunidades de exportação. É uma decisão estratégica para o país.
- O que falta para popularizar o Creative Commons? Lessig - Estamos ganhando adesões rapidamente. Nosso desafio atual é articular com vários países a harmonização internacional das licenças. É preciso que elas façam sentido com as legislações de propriedade intelectual de vários países. - Algumas pessoas vêem o Creative Commons como forma de contribuir para a cultura global sem desejar nada em troca. E se sentem desconfortáveis com a idéia de que empresas como a Wikia, de Jimmy Wales, podem ganhar dinheiro com isso. O que o senhor acha? Lessig - O dinheiro não precisa ser o motivo de todas as transações de nossa vida. O mundo seria muito desumano se fizéssemos tudo pensando em moeda corrente. Mantemos relações de amizade e companheirismo com interesses mais difusos. Não posso convidá-lo para um jantar e depois dizer: desculpe, tive um imprevisto, mas tome US$ 200 para compensar. Por outro lado, é importante mostrar que é possível criar empresas lucrativas dentro de modelos de negócios baseados no Creative Commons. - A própria Microsoft, uma defensora dos modelos antigos de propriedade intelectual, resolveu incluir a opção de Creative Commons em alguns de seus softwares. Como o senhor vê isso? Lessig - Alguns têm uma visão maniqueísta. Imaginavam que eu tivesse algum antagonismo pessoal em relação à Microsoft. É claro que ela tomou algumas atitudes erradas em sua luta para defender o próprio negócio e tentar derrubar o crescimento do software livre. Mas a empresa é grande. Dentro dela tem gente com cabeça mais arejada. Podemos ler a decisão da Microsoft como sinal de que a empresa está mudando e entendendo o momento histórico.

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