quinta-feira, 28 de maio de 2009

gabriele wohmann

Aos 75 anos, a alemã Gabriele Wohmann faz parte da geração de escritores filhos da guerra e está completando meio século de carreira literária, mas é praticamente desconhecida no Brasil. A primeira tradução de seus contos está saindo agora pela Editora da UFSC, a partir de seleção feita pela professora Rosvitha Friesen Blume, do Departamento de Língua e Literatura Estrangeiras da Universidade. “Contos de Gabriele Wohmann” traz 10 histórias de pouca ação, número reduzido de personagens, estruturas monológicas e uma temática que ressalta os conflitos de indivíduos consigo mesmos, com a família e com o círculo mais próximo de amigos e conhecidos. Como pano de fundo, uma Alemanha de mulheres e homens tediosos, voluntariamente alienados, marcados pelo passado e sem saber o que fazer com o conforto trazido pela prosperidade do pós-guerra. Os textos escolhidos pela tradutora abarcam o período que vai de 1958 a 2000 e têm um ponto em comum: os protagonistas são sempre personagens femininas, geralmente de classe médio pequeno-burguesa. Além de dar uma visão panorâmica da obra da autora, Rosvitha Blume permite ao leitor observar a forma mordaz com que Wohmann trata essas personagens, não porque deseja ser ácida com elas, mas em vista da distância entre o discurso da libertação feminina e o cotidiano opressor que, paradoxalmente, a riqueza e comodidade das décadas subseqüentes ao grande conflito mundial trouxeram para um grande número de alemães. Gabriele Wohmann nasceu em 1932 na cidade de Darmstadt e começou a escrever em 1957. Já nos anos 60 obteve grande reconhecimento da crítica literária alemã pela maestria com que criava seus contos, que já foram traduzidos para 12 línguas. Conhecida em seu país como a “escritora do olhar maldoso”, ela mergulha fundo na interioridade de seus personagens, retratando a vida privada da sociedade alemã na segunda metade do século XX. Nessa tarefa, denuncia as mazelas de uma burguesia que emergiu do capitalismo tardio e que tenta, ao mesmo tempo, esquecer o passado genocida e acomodar-se a uma “normalidade” e a um bem-estar que procuram encobrir feridas de difícil cicatrização. Rosvitha Friesen Blume, a tradutora, é graduada em Letras-Português na UFPR e desde 1990 leciona Língua e Literatura Alemã na UFSC, onde concluiu, em 2005, o doutorado em literatura com uma tese sobre a obra contística de Gabriele Wohmann. Hoje, ela trabalha também como professora e orientadora no curso de pós-graduação em Estudos da Tradução da UFSC, com a linha de pesquisa Teoria, Crítica e História da Tradução.
Desde quando se interessou pela obra de Gabriele Wohmann e o que mais a atrai na produção da escritora alemã? Rosvitha Blume – Acho que foi em 1999 que li pela primeira vez alguns contos de Wohmann, que me fascinaram imediatamente pela profundidade com que tratavam da vida privada de seus personagens, freqüentemente mulheres, mas também homens, em conflitos consigo mesmos e com as pessoas de sua convivência mais próxima. Fiquei encantada com a sensibilidade com que a autora trata de temas íntimos e comumente pouco abordados na literatura, justamente as ‘pequenas’ tragédias do cotidiano, muito distantes da grande cena pública. Como situa a autora no contexto da moderna literatura alemã e européia? Rosvitha – Gabriele Wohmann é um dos nomes mais conhecidos da geração de escritores filhos da guerra. Nascida em 1932, iniciou sua carreira literária no final dos anos 50. Já nos anos 60 tornou-se famosa pelos seus contos curtos, semelhantes à “short story” americana. Recebeu inúmeros prêmios literários ao longo de mais de quatro décadas de intensa produção literária. Hoje, aos 75 anos de idade, ainda escrevendo, continua sendo considerada uma das mais criativas e perspicazes contistas do cotidiano alemão. As mulheres constituem o centro das ações nos contos escolhidos. Isso foi uma opção deliberada ou a obra de Gabriele se ocupa essencialmente desse tema? Rosvitha – Esse foi um dos meus critérios de escolha. Eu diria, e defendi isso em minha tese de doutorado (2005, na UFSC), que a obra de Wohmann trata essencialmente do tema da mulher, muito embora a autora tenha rejeitado, ao longo de sua carreira, qualquer rotulação feminista.
Ela é extremamente mordaz e crítica em relação à sociedade alemã. Isso faz dela uma escritora diferenciada ou esta seria uma tendência da atual produção literária em seu país? Rosvitha – Gabriele Wohmann é conhecida na Alemanha como ‘a escritora do olhar maldoso’. Nesse sentido ela ocupa, sim, um lugar especial entre os autores de sua geração. Ela sabe ser extremamente mordaz, expondo por vezes de um modo quase cruel as mazelas de seus personagens, geralmente femininos. Na verdade, os contos refletem um pouco da dificuldade que as mulheres, especialmente da (pequena) burguesia alemã, encontraram para concretizar em seu cotidiano os discursos de libertação e auto-realização da mulher tão apregoados a partir dos anos 60. Tem planos para traduzir mais livros de Gabriele ou de outros autores alemães pouco conhecidos no Brasil? Rosvitha – No momento estou concentrada na ‘descoberta’ de contistas alemãs muito jovens, como Juli Zeh, Silke Scheuermann, Julia Frank, entre outras, cujas personagens são, também, mais jovens e mais emancipadas do que as de Wohmann. É um novo século, uma nova geração e também um novo ‘tom’. Pretendo publicar uma antologia com traduções de alguns desses contos num futuro próximo.

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