sexta-feira, 1 de maio de 2009

paul j.steinhardt "O eterno retorno do mesmo"

paul j.steinhardt
http://wwwphy.princeton.edu/~steinh/
"E se um dia ou uma noite um demônio se esgueirasse em tua mais solitária solidão e te dissesse: Esta vida, assim como tu vives agora e como a viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indizivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência." É difícil resistir à tentação de lembrar essa passagem de Nietzsche ("Gaia Ciência", IV, 341) sobre o eterno retorno para comentar um novo modelo cosmológico proposto por Paul Steinhardt, da Universidade de Princeton (EUA), e Neil Turok, do Centro para Ciências Matemáticas, em Cambridge (Reino Unido).Os dois cientistas publicaram na "Science" da semana passada um artigo em que sugerem um Universo cíclico, no qual haveria sequências intermináveis de Big Bangs (grandes explosões) alternados por Big Crunchs (grandes esmagamentos).As hipóteses propostas por Steinhardt e Turok encerram muita especulação (mais do que o normal mesmo em cosmologia, já o mais especulativo dos ramos da física) e vão contra a idéia largamente aceita de que um único Big Bang, a explosão primordial, deu origem ao Universo.Não pretendo, por incompetência na matéria, alongar-me em discussões técnicas sobre a consistência de um Universo cíclico. Interessa-me apenas o modo como cientistas tratam teorias rivais.Há dois anos, em abril de 2000, cientistas do grupo do italiano Paolo de Bernardis, da Universidade de Roma, anunciavam -até com alguma exaltação- que haviam colhido indícios altamente convincentes em favor do modelo de um Universo em expansão eterna, o Big Bang único e sem Big Crunch.Variações mínimas na temperatura da radiação cósmica de fundo indicaram que não existe matéria suficiente no Universo para que a força da gravidade provoque o colapso de suas estruturas. O Universo seria assim plano, infinito e se expandiria indefinidamente. A hipótese do Big Crunch parecia mais afastada. Esse ainda é o modelo que podemos chamar de "oficial".Já a idéia de Universo cíclico de Steinhardt e Turok opera com outros pressupostos. Ele utiliza em seus cálculos o conceito de energia escura. Ninguém sabe ao certo o que é a energia escura nem como ela atua, mas o fato é que ela está lá. Já foi detectada empiricamente.Sabemos, pelos cálculos de De Bernardis, que a gravidade interagindo com toda a matéria existente não teria força suficiente para provocar um Big Crunch. Mas, se acrescentarmos ao conjunto essa tal da energia escura -desde que ela atue como os pesquisadores acham que ela atua-, então o modelo ganha consistência.O bonito nas teorias cosmológicas é que, ao mesmo tempo em que elas são ciência em estado bruto, aproximam-se das grandes mitologias fundadoras. Pelo lado do Universo cíclico, vale lembrar que os antigos egípcios já falavam no eterno retorno do disco solar, das cheias do Nilo e das estações. A Lei de Thot proclama: "Tudo é ciclo".Pelo Universo plano, fala a própria Igreja Católica. O Vaticano já em 1951 afirmou que julgava a hipótese do Big Bang válida e não violadora da verdade. Com efeito, o mundo criado por um evento singular se aproxima bastante da idéia de um Demiurgo.Mas as semelhanças entre cientistas e religiões logo cessam. Na ciência, duas ou mais teorias rivais podem coexistir de modo mais ou menos sereno. Em religião, isso é bem mais difícil. Basta tomar o exemplo da difícil convivência entre judeus, cristãos e muçulmanos. E, vale lembrar, que esses três grandes monoteísmos cultuam o mesmíssimo Deus, aquele que mandou Abraão sair de Ur, na Caldéia, em busca da Terra Prometida.
A diferença fundamental fica por conta do fato de que a ciência prevê seu próprio erro. Em termos epistemológicos, mesmo a mais sólida das "verdades" é provisória e está sujeita a revisão. A ciência não tem a pretensão de ser a expressão última de uma verdade revelada e imutável.É claro que alguns cientistas podem, individualmente, defender suas teorias mesmo contra todas as evidências. Mas, nestes casos, eles estão sendo mais humanos -e, portanto, teimosos- do que cientistas propriamente ditos.No plano das religiões, essa "tolerância" é bem mais difícil. É até natural que seja assim. Um sistema de crenças que visa à transcendência teria dificuldades para admitir que toda verdade é precária quase ao ponto de não ser mais reconhecida como verdade. Nessas condições, acho que seria extremamente difícil fundar uma moral. Para que ela soe convincente, a lei divina, o "não cobiçarás a mulher do próximo", por exemplo, deve ser um mandamento que vale hoje, amanhã e sempre. A religião não apenas não admite o próprio erro como, segundo algumas leituras, exige que todos, mesmo os "infiéis", ajam segundo os seus ditames. É a receita para o conflito.É nesse ponto que vale a pena investigar melhor o sentido do eterno retorno em Nietzsche. Trata-se, sem sombra de dúvida, de um dos tópicos mais fundamentais e também difíceis de sua filosofia. Ele se inscreve na guerra contra o cristianismo que o filósofo travava. "Grossissimo modo", enquanto o cristianismo opõe o tempo à eternidade para valorizar a última, Nietzsche proclama a eternidade do próprio tempo.Como o tempo jamais se esgota, nele ocorre tudo o que é possível. Como ele ainda assim não se esgota, tudo o que é possível se repete inúmeras vezes num esforço para preencher o seu curso.É aqui que entra o super-homem nietzscheano. Só ele, que já compreendeu a morte de Deus, que sabe que não existem valores supremos, só ele, que está além do bem e do mal, vai ser capaz de dizer sim ao eterno retorno. Apenas o super-homem nietzscheano é capaz de aceitar como uma boa notícia e não como uma tortura a idéia de que está condenado a reviver eternamente sua própria vida, com "o que há de indizivelmente pequeno e de grande".Há aí uma negação radical da religião. Enquanto o cristianismo nos promete um outro mundo, o eterno retorno nietzscheano nos atira inapelável e infinitamente neste aqui. Com o eterno retorno, Nietzsche vai aos recônditos do Universo para afirmar que o mundo que conta é o daqui.Receio que também a física, quando entra em terreno tão especulativo como o da cosmologia, acabe falando mais deste mundo -de nossas ignorâncias e idéias recorrentes- do que das origens do Universo como pretendia.Por mais teorias cosmológicas que desenvolvamos, sempre será lícito fazer novas e mais profundas indagações filosóficas. Hoje perguntamos pelo que provocou a singularidade, pelo que gerou o ponto de densidade infinita que há 14 bilhões de anos houve por bem explodir dando origem a toda a matéria e a energia existentes. Amanhã, poderemos estar nos questionando pelo que deu causa à primeira de uma série eterna de explosões universais. Num certo sentido, não avançamos tanto em relação ao primeiro filósofo que se perguntou -e não tinha como responder- pela origem de tudo.

Um comentário:

  1. O UNIVERSO ANTES DO BIG BANG

    Para entendermos a auto criação do universo, temos que partir do nada material,
    uma energia escura sem massa em estado de repouso ou vácuo quântico. Porque se fosse criado a partir de uma matéria existente não seria o início e sim uma etapa da criação.
    Um sistema fechado sempre está sujeito à flutuação do ponto zero. Havendo o deslocamento de uma energia, receberá uma resistência em sentido contrário, como um pêndulo, iniciando um movimento ondulatório, e estará criado o espaço e o início do tempo. O vácuo em estado de repouso se opõe às forças de compressão ou expansão, mas a vibração de uma energia é natural, pois o espaço já foi criado, haverá apenas a troca de posição no espaço em instantes de tempo ad-perpetum.
    A matéria é energia em vibração, a ciência percorrendo o caminho inverso da criação, decompôs a matéria em seus elementos constituintes até chegar à energia parada, onde não existe o espaço e o tempo, mas contêm todas as possibilidades de existência, inclusive o homem e sua consciência.
    A primeira vibração do vácuo concentrou a energia num espaço reduzido, produzindo o aumento da velocidade da vibração pelas forças de compressão e expansão, gerando a primeira partícula, o bóson de Higgs que se desdobrou em Quarques, que se desdobraram em Prótons, Nêutrons e Elétrons, e estavam criadas as partículas para a montagem dos átomos de hidrogênio. Formando um universo desse gás, sujeito à atração gravitacional, para formar estrelas e dar início à produção em série dos elementos químicos que compõem o universo atual.
    Esta, deve ter sido a trajetória da auto criação do universo, se houve uma grande explosão foi muito depois que o universo já estava criado.
    Se não foi assim, teria que haver uma inteligência fora desse sistema, como supôs Platão, um deus, o demiurgo (“fabricante” ou “artesão”), que, contemplando de fora como observador, tratou de produzir suas experiências de criação, sujeitas a erros de percurso, culminando com o acidente de uma grande explosão. Para depois seguir com novas experiências, inclusive a vida, tantas vezes interrompida aqui na terra, e teríamos que perguntar, quem criou esse demiurgo? E assim sucessivamente.
    É muito mais lógico o panteísmo de Anaxágoras, Giordano Bruno, Spinosa e outros, que Deus é a natureza. Se a matéria é energia em vibração, como disse Virgilio, (“Mens agitat molem” o espírito anima a matéria). O espírito de Deus ou vácuo quântico se expressa na matéria, tornando-se o UNO de Plotino. Portanto, Deus é espírito e matéria, se não fosse assim nem estaríamos nos referindo a Ele.
    A tradição mística, sempre divinizou o espírito e erroneamente demonizou a matéria, agora as religiões deverão assimilar essa nova compreensão da realidade, para se reconciliarem com o divino, sob pena de continuarem ofendendo a Deus.
    Pelo exposto, deduz-se que a auto criação é dinâmica, não segue nem um propósito, como disse o sofista Protágoras (não há nada decretado no céu para ser cumprido na terra, o homem é livre para fazer e desfazer o que lhe aprouver para o seu destino). Tanto é assim, que o futuro da humanidade é incerto, vai depender da ação dos governantes das nações.
    A ciência descobriu Deus, com outros nomes, embora não admita, mas para nós pensadores teístas basta, para continuarmos a nossa fé justificada.

    Ivo da Silva Bitencourt -30/12/2009

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