quinta-feira, 30 de abril de 2009

Steven Pinker

-Em seu livro Tábula Rasa, o senhor afirma que os genes afetam a forma como as pessoas pensam e sentem. Essa não é uma idéia bem estabelecida hoje? Por que escrever mais um livro sobre o tema?Steven Pinker - O livro é muito mais sobre explorar as implicações morais, políticas e sociais dessa descoberta. Muitas pessoas ficam irritadas com essa idéia e até para alguns cientistas esse não é um conceito do qual eles se lembram com freqüência. Muitas pesquisas em psicologia, por exemplo, ignoram o fato de que os genes afetam a personalidade. Um exemplo são pesquisas que relacionam a forma como os pais tratam uma criança e o que elas se tornam depois. Nelas, uma criança que foi espancada por seus pais irá criar um adulto mais violento. Eles assumem que a relação de "correlação" é uma relação "causal" e concluem automaticamente que foi o comportamento dos pais que moldou a criança. Eles não chegam nem a testar a possibilidade de que pode haver genes que predispõem as pessoas para a violência. Como pais dão para seus filhos genes e um ambiente, essa "correlação" pode estar simplesmente dizendo que pessoas violentas espancam seus filhos e estes filhos, que herdam os genes violentos, são também violentos.- Mas por que é tão difícil para as pessoas aceitar o fato de que a natureza humana é, ao menos parcialmente, biológica?Pinker - Há pelo menos quatro razões. Primeiro, há a teoria da diferença, que é a tábula rasa. Ela diz que todos devemos ser iguais, pois zero igual a zero, igual a zero. Se algumas pessoas tiveram algo diferente escrito ou mais coisas escritas na tábula do que outras, elas seriam diferentes. A teoria é que isso justificaria a discriminação e opressão, que isso poderia ser usado para justificar a discriminação de mulheres ou grupos étnicos com base na idéia de que elas são psicologicamente diferentes por causa de seus genes. - Mas essas diferenças genéticas existem...Pinker - Muitos estudiosos acham que as diferenças entre mulheres são socialmente construídas ou que as diferenças entre as pessoas são simplesmente produto da forma como eles são tratados pelo mundo. As diferenças entre os sexos certamente não vêm somente da socialização ou cultura, mas esses fatos ainda são negados por muitos acadêmicos. Há muitos que ainda acreditam que todas as diferenças entre os sexos vêm da forma como se educa meninos e meninas. A segunda teoria é de que todos os traços indesejáveis nos seres humanos são inatos, como egoísmo, sexismo ou agressividade; são imutáveis e que qualquer tentativa de mudá-lo é uma perda de tempo. A terceira teoria é a do determinismo, na qual todo o comportamento deve ser atribuído aos genes, então ninguém seria responsável por seus atos. E não poderíamos punir as pessoas por seus comportamentos, pois eles vêm dos genes. A quarta é a teoria do niilismo, a teoria de que tudo que temos de mais sagrado - amor, beleza, moral - é somente pedaços de genes tentando se transmitir para a próxima geração.
- Então não somos intrinsecamente bons?Pinker - O bom selvagem é um mito. Todos os estudos quantitativos existentes mostram que o homicídio existia antes das sociedades organizadas por leis e que a taxa de violência nessas sociedades mais antigas é bem maior do que as das sociedades industriais modernas. Apesar da idéia muito divulgada de que os caçadores-coletores viviam em paz e harmonia e que a violência é uma criação das instituições modernas. E, também, há estudos que mostram que pessoas, especialmente homens, têm fantasias homicidas. Algumas vezes eles pensam em matar pessoas de que não gostam. - A violência faz parte da natureza humana?Pinker - Os pensamentos violentos, sim, mas o que vamos fazer com eles depende do ambiente em que estamos. - E os relatos de Margaret Mead sobre tribos que não conheciam a violência?Pinker - As descrições dela sobre os nativos da Nova Guiné, amantes da paz e dos sexualmente displicentes samoanos, basearam-se em pesquisas superficiais e se revelaram quase perversamente erradas. Como documentou posteriormente o antropólogo Derek Freeman, os samoanos podem espancar ou matar as filhas se elas não forem virgens na noite de núpcias. - E a idéia de que temos algo dentro de nós, que comanda o nosso cérebro, as nossas ações?Pinker - Todas as emoções e pensamentos podem ser relacionados a uma atividade fisiológica do cérebro e não há nenhuma razão para acreditar que seja necessário uma substância extra, chamada alma, para gerar os comportamentos que temos. - E o que é alma, então?Pinker - Acho que é a atividade de processamento de informações no cérebro. - E quando morremos é o fim?Pinker - Sim. No século 19, muitos cientistas sérios tentaram se comunicar com os mortos. Tenho de dizer que as experiências foram um fracasso.- Por que, na opinião do senhor, ainda se acredita no bom selvagem e na alma?Pinker - Houve boas razões históricas para as pessoas tirarem a ênfase da genética na evolução. Uma delas foi o mau uso delas pelos eugenistas, que há cem anos diziam que a reprodução humana deveria ser controlada para melhorar a adaptação da nossa espécie ao ambiente em que vivemos. Ela foi invocada também para dizer que as mulheres eram biologicamente não adaptadas para pensar e tomar decisões. E mais terrivelmente foram usadas pelos nazistas para justificar o genocídio de judeus e ciganos. Acho que houve uma enorme revolta contra qualquer tentativa de conectar biologia a comportamentos humanos. - E qual o papel do acaso na nossa vida?Pinker - Muita da variação de inteligência e personalidade existente entre nós não pode ser atribuída nem a genes nem ao ambiente. Se você olhar gêmeos idênticos que foram criados na mesma família, mesmo local, mesma cultura, mesma casa, você verá que eles são muitos mais parecidos do que outros pares de pessoas, mas eles estão longe de ser idênticos. As similaridades entre suas personalidades e inteligências talvez seja de 50% em média. Isso mostra que as diferenças não podem vir dos genes, pois eles têm genes iguais, e também não pode vir diretamente do ambiente, pois tiveram os mesmos pais, vizinhos, casa. Essas diferenças vêm simplesmente de um processo randômico, do acaso, e têm uma grande influência naquilo que somos. Acasos como um bebê que cai de cabeça no chão, um vírus que ele pega, um pensamento que deixe uma impressão permanente. Esses fatores podem ter uma influência tão grande quanto os genes no que somos, uma influência muito maior do que os pais exercem numa pessoa. - Boa parte do que somos é, então, produto do acaso?Pinker - Ao menos boa parte daquilo que nos faz diferentes uns dos outros em uma mesma cultura é o acaso. - O senhor também afirma no livro que o pós-modernismo é baseado na tábula rasa e que ele destrói toda a graça das artes.Pinker - O pós-modernismo certamente nega que exista algo como a natureza humana. Para eles, toda nossa experiência, amor romântico, ciúmes, diferença entre os sexos são construções sociais que poderiam ser diferentes se a história tivesse se desenvolvido de outra forma. No caso da arte, o pós-modernismo nega que temos a capacidade de ter prazer com ela. Eles vêem a arte como um produto de forças econômicas e políticas. Ao negar a possibilidade de as pessoas terem uma habilidade inata em ter prazer com a beleza, a melodia, histórias e outras leva à criação de uma arte à qual falta sensibilidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário