A meu ver, a solução não está no voto eletrônico permanente, que nos é anunciado como tecnicamente possível. Eu acho que isso criaria uma espécie de curto-circuito "societal" entre os cidadãos e as elites dirigentes. Por outro lado, sou favorável ao uso das redes para uma co-regulação cidadã: integrando ao mesmo tempo os sistemas técnicos e a representatividade humana, essa nova forma de participação cidadã respeitaria os níveis intermediários indispensáveis que são os eleitos locais.Dessa forma, já estamos assistindo ao que se poderia chamar de um embrião de "ciber-democracia": internautas reagrupados em fóruns, expressando-se diretamente junto a seus colegas por e-mail, ou criando seu próprio site, exercendo um novo poder, que até o momento estava oculto e não possuía uma verdadeira relação de força diante dos Estados, das grandes indústrias e até dos lobbies internacionais. Pela primeira vez surge a possibilidade de expressão por pequenos grupos, e não apenas pelo voto democrático maciço. Essa nova participação cidadã insere-se como complemento, e não em substituição, aos outros meios de expressão, dos quais será necessário reinventar a influência e o papel, especialmente com relação ao que se pode chamar de "C to G" (cidadão para governo) que é mais ou menos o "feed-back" social ao qual todos nós aspiramos.Todos os cidadãos têm as mesmas chances de se integrar a essas novas iniciativas?Temos que acreditar nisso, embora não se possa negar que está se abrindo um fosso entre os países, e também entre as gerações. É verdade que existe um risco de isolamento, de segregação social e exclusão. Por essa razão, é importante remediar isso desde já. A Internet por um lado atinge todas as camadas da população: famílias, estudantes, professores, mundo do trabalho, empresas, etc. Os preços dos computadores estão diminuindo, as conexões vão se tornar gratuitas, e os programas também terão seus preços reduzidos. A Internet vai se democratizar nos próximos dez anos inclusive, como já se vê, nos países emergentes.Por outro lado, quanto mais o mundo se desmaterializar através da eletrônica, mais precisaremos compensar essa virtualidade pela realidade do contato humano. Quando o livro surgiu, os clérigos disseram que isso era a pior coisa que podia acontecer, porque ele reduziria os contatos humanos. Com a Internet e as telas em geral, encontramos os mesmos receios. Mas sou levado a crer que a Internet seguirá o mesmo caminho do livro, do telefone, da televisão e do automóvel: inicialmente reservadas aos mais ricos, essas técnicas difundiram-se largamente, no interesse de todos e como fator de comunicação entre as pessoas.Como fazer para não se afogar nessa extraordinária massa de possibilidades de comunicação?De fato, "surfar" na Internet certamente pode levar a um borboletear estéril, análogo ao "zapping" na televisão, se essa atividade não for contextualizada ou enquadrada. Daí a importância de incorporar dados às informações, informações ao saber, saber aos conhecimentos e conhecimentos às culturas. Mas esse processo implica numa mediação, e é aí que os professores de escola têm um papel fundamental a desempenhar: o professor como mediador e integrador dos conhecimentos, como "passadores" para a iniciação no saber nas mais complexas redes; e a escola (as turmas conectadas não à, mas pela Internet), como local de socialização, de co-educação e de integração das culturas. Assim como já existe o "e-comércio", haverá a "e-educação". Nesse campo, tudo ainda está por inventar.Que grandes tendências delineiam-se na alvorada do século XXI em matéria de ciência da informação?Por mais realista que seja prever o futuro de um mundo envolvido numa extraordinária transformação, acredito que a primeira mudança ocorrerá no aumento da capacidade de receber imagens e sons de boa qualidade. Depois virão os programas especializados que nos ajudarão a navegar nesse oceano de informações que serão os 10 bilhões de páginas web de 2003.A Internet móvel, ou seja que possa ser consultada a partir de telefones celulares ou de assistentes pessoais digitais, já é possível... Eu acho que em cinco anos veremos chegar assistentes pessoais digitais dotados de capacidades de telefonia de alta capacidade e telas coloridas de tamanho aceitável, enquanto não chegam os óculos conectáveis aos assistentes pessoais digitais, e que projetarão diante de nossos olhos uma tela virtual de 50x50 cm!O meio de comunicação do futuro, paradoxalmente, a meu ver não será a Internet, mas a televisão digital com capacidade de navegação oferecida pela Internet. É da fusão desses dois que irá nascer, nos próximos cinco anos, a capacidade de transmissão de imagens e sons para uma comunicação direta. Podemos imaginar uma "videofonia" de boa qualidade, bilateral ou em grupo, e sobretudo a criação de programas de televisão pelos próprios usuários, difundidos nos mesmos canais da Internet... O fenômeno atual das páginas pessoais irá se transformar, estou convencido disso, em fenômeno de cadeias pessoais de televisão, para o melhor e para o pior. Mas eu acho que o verdadeiro desafio do futuro é a simbiose entre os instrumentos eletrônicos, o corpo e o espírito humano. Desde o final dos anos 90, os “biocaptores” (“biochips” implantados próximo a determinados órgãos cuja função eles regulam) fizeram progressos consideráveis. Seguindo esse impulso, amanhã o corpo humano será utilizado como uma rede de recepção e transmissão de informação. Logo estaremos usando computadores “prontos para uso”, integrados às roupas, mas também “ajustáveis” às maçanetas das portas, aos chaveiros, que se comunicarão através de uma rede sem fio.Nem super-homem, nem bio-robô, nem super-computador, ou mega-máquina, o homem do futuro será simplesmente o homem simbiótico, em parceria estreita – se conseguir construí-lo – com o sistema "societal" exteriorizado a partir de seu cérebro, de seus sentidos e de seus músculos. Porém, mais do que imaginar o futuro, o melhor a fazer é inventá-lo.terça-feira, 28 de abril de 2009
Joël de Rosnay
A meu ver, a solução não está no voto eletrônico permanente, que nos é anunciado como tecnicamente possível. Eu acho que isso criaria uma espécie de curto-circuito "societal" entre os cidadãos e as elites dirigentes. Por outro lado, sou favorável ao uso das redes para uma co-regulação cidadã: integrando ao mesmo tempo os sistemas técnicos e a representatividade humana, essa nova forma de participação cidadã respeitaria os níveis intermediários indispensáveis que são os eleitos locais.Dessa forma, já estamos assistindo ao que se poderia chamar de um embrião de "ciber-democracia": internautas reagrupados em fóruns, expressando-se diretamente junto a seus colegas por e-mail, ou criando seu próprio site, exercendo um novo poder, que até o momento estava oculto e não possuía uma verdadeira relação de força diante dos Estados, das grandes indústrias e até dos lobbies internacionais. Pela primeira vez surge a possibilidade de expressão por pequenos grupos, e não apenas pelo voto democrático maciço. Essa nova participação cidadã insere-se como complemento, e não em substituição, aos outros meios de expressão, dos quais será necessário reinventar a influência e o papel, especialmente com relação ao que se pode chamar de "C to G" (cidadão para governo) que é mais ou menos o "feed-back" social ao qual todos nós aspiramos.Todos os cidadãos têm as mesmas chances de se integrar a essas novas iniciativas?Temos que acreditar nisso, embora não se possa negar que está se abrindo um fosso entre os países, e também entre as gerações. É verdade que existe um risco de isolamento, de segregação social e exclusão. Por essa razão, é importante remediar isso desde já. A Internet por um lado atinge todas as camadas da população: famílias, estudantes, professores, mundo do trabalho, empresas, etc. Os preços dos computadores estão diminuindo, as conexões vão se tornar gratuitas, e os programas também terão seus preços reduzidos. A Internet vai se democratizar nos próximos dez anos inclusive, como já se vê, nos países emergentes.Por outro lado, quanto mais o mundo se desmaterializar através da eletrônica, mais precisaremos compensar essa virtualidade pela realidade do contato humano. Quando o livro surgiu, os clérigos disseram que isso era a pior coisa que podia acontecer, porque ele reduziria os contatos humanos. Com a Internet e as telas em geral, encontramos os mesmos receios. Mas sou levado a crer que a Internet seguirá o mesmo caminho do livro, do telefone, da televisão e do automóvel: inicialmente reservadas aos mais ricos, essas técnicas difundiram-se largamente, no interesse de todos e como fator de comunicação entre as pessoas.Como fazer para não se afogar nessa extraordinária massa de possibilidades de comunicação?De fato, "surfar" na Internet certamente pode levar a um borboletear estéril, análogo ao "zapping" na televisão, se essa atividade não for contextualizada ou enquadrada. Daí a importância de incorporar dados às informações, informações ao saber, saber aos conhecimentos e conhecimentos às culturas. Mas esse processo implica numa mediação, e é aí que os professores de escola têm um papel fundamental a desempenhar: o professor como mediador e integrador dos conhecimentos, como "passadores" para a iniciação no saber nas mais complexas redes; e a escola (as turmas conectadas não à, mas pela Internet), como local de socialização, de co-educação e de integração das culturas. Assim como já existe o "e-comércio", haverá a "e-educação". Nesse campo, tudo ainda está por inventar.Que grandes tendências delineiam-se na alvorada do século XXI em matéria de ciência da informação?Por mais realista que seja prever o futuro de um mundo envolvido numa extraordinária transformação, acredito que a primeira mudança ocorrerá no aumento da capacidade de receber imagens e sons de boa qualidade. Depois virão os programas especializados que nos ajudarão a navegar nesse oceano de informações que serão os 10 bilhões de páginas web de 2003.A Internet móvel, ou seja que possa ser consultada a partir de telefones celulares ou de assistentes pessoais digitais, já é possível... Eu acho que em cinco anos veremos chegar assistentes pessoais digitais dotados de capacidades de telefonia de alta capacidade e telas coloridas de tamanho aceitável, enquanto não chegam os óculos conectáveis aos assistentes pessoais digitais, e que projetarão diante de nossos olhos uma tela virtual de 50x50 cm!O meio de comunicação do futuro, paradoxalmente, a meu ver não será a Internet, mas a televisão digital com capacidade de navegação oferecida pela Internet. É da fusão desses dois que irá nascer, nos próximos cinco anos, a capacidade de transmissão de imagens e sons para uma comunicação direta. Podemos imaginar uma "videofonia" de boa qualidade, bilateral ou em grupo, e sobretudo a criação de programas de televisão pelos próprios usuários, difundidos nos mesmos canais da Internet... O fenômeno atual das páginas pessoais irá se transformar, estou convencido disso, em fenômeno de cadeias pessoais de televisão, para o melhor e para o pior. Mas eu acho que o verdadeiro desafio do futuro é a simbiose entre os instrumentos eletrônicos, o corpo e o espírito humano. Desde o final dos anos 90, os “biocaptores” (“biochips” implantados próximo a determinados órgãos cuja função eles regulam) fizeram progressos consideráveis. Seguindo esse impulso, amanhã o corpo humano será utilizado como uma rede de recepção e transmissão de informação. Logo estaremos usando computadores “prontos para uso”, integrados às roupas, mas também “ajustáveis” às maçanetas das portas, aos chaveiros, que se comunicarão através de uma rede sem fio.Nem super-homem, nem bio-robô, nem super-computador, ou mega-máquina, o homem do futuro será simplesmente o homem simbiótico, em parceria estreita – se conseguir construí-lo – com o sistema "societal" exteriorizado a partir de seu cérebro, de seus sentidos e de seus músculos. Porém, mais do que imaginar o futuro, o melhor a fazer é inventá-lo.
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