sexta-feira, 1 de maio de 2009

eric laurent

Eric Laurent
www.nucleosephora.com/asephallus/numero_04/pdf/atualidades_01.pdf
Como se posiciona a psicanálise frente à cultura dos antidepressivos?Ao contrário do que está escrito na Declaração de Independência dos Estados Unidos sobre a busca da felicidade, estamos em uma cultura na qual se tende a persuadir de que todo aquele que não é realmente feliz, está deprimido. Nos anos 60, um dos primeiros antidepressivos, a amipramina, só era utilizada em casos graves. Depois, as pessoas começaram a tomar toneladas de Valium e ansiolíticos para ficarem tranqüilos e buscou-se um medicamento que fosse utilizado por todos. Depois veio o entusiasmo pelo Prozac e o (bestseller) ‘Prozac Nation’. Os novos antidepressivos pareciam não ter efeitos secundários e todos tomavam quando estavam tristes.
Funcionaram?Não. Em lugar de reduzir a taxa de tristeza, nos países ricos, onde mais se consumia, um quarto da população tinha depressão. Tornou-se uma epidemia. Os novos medicamentos acompanham a cultura de hoje. Não há um instante perdido na performance dos homens. Tudo tem que ser produtivo: é preciso correr mais rápido, ter melhor sexo, dormir e pensar melhor. Frente a essas más notícias, a resposta é que há uma pílula para tudo.E o que propõe a psicanálise?Em uma época de morais vitorianas e de proibições, Freud disse: “todos esses ideais são mentiras”. Esta é uma época de produtividade generalizada, em que você é empresário de si mesmo e tem que maximizar tudo. Isto pode levar à adição geral deste mundo, seja o trabalho, o esporte ou as substâncias. A psicanálise diz que isso é tão mentiroso quanto o de antes. Você tem que conseguir uma solução para você mesmo e não conformar-se com o modelo que lhe propõem. Não se pode negar que existem casos de depressão graves que precisam ser tratados, mas é preciso diferenciar entre a tristeza que se pode suportar e a depressão que lhe mata. E animar-se a pensar que os agentes da indústria não sabem mais que você.Parece uma luta entre David, a psicanálise, e Golias, a indústria.O que a psicanálise questiona é o discurso da estandardização: a idéia de que, em sua desgraça, você tem que se comportar de uma maneira standard. Você não está bem, mas pode tomar uma coca ou a mesma pastilha. Quando alguém não está demasiado doente ou não sofre tanto, se analisa. Pode tratar sua tristeza e, além disso, saber por que veio a tristeza para sua vida. E como sua tristeza é parte da sua história e não da do seu vizinho, pode reintegrar sua história. E deixar de considerar-se como uma máquina.Em que consiste a luta entre lacanianos e freudianos?Só há luta onde há psicanalistas de verdade. Em Paris, Buenos Aires, São Paulo, Rio de Janeiro ou Bahia. Mas a realidade é que os verdadeiros freudianos somos nós. A diferença entre Lacan e Freud é como a de Newton e Einstein. A mecânica do mundo foi descoberta por Newton, mas Einstein a generalizou, a partir dos descobrimentos do primeiro. No sistema de Lacan, encontram-se os resultados de Freud, transformados pela generalização. Isto permite mudar alguns parâmetros do “dispositivo freudiano”: duração da sessão, categorias clínicas, vocabulário. O problema não é quem foi melhor, mas que os lacanianos querem estar à altura destes tempos.A psicanálise não é muito dogmática?Ao generalizar Freud, Lacan revelou algo que estava escondido: que Freud não cessou nunca de reinterpretar a psicanálise, de inventar, contradizer-se, produzir coisas novas. Quer dizer, a obra de Freud não pode ser dogmatizada. É um movimento de constante reinterpretação. Em Lacan, isto se potencializa. Lacan não cessa de reinterpretar-se a si mesmo: pode-se dizer que a cada cinco anos, Lacan se renova. Há muitos Lacan que vão pelo mundo e sempre há um estilo que contrasta, que se pode ler de múltiplas maneiras. E, por outro lado, há frases muito simples, tais como “a mulher não existe”, “não há relação sexual” e “pode-se prescindir do pai, fazendo uso dele”, que todo mundo entende. Mas, construir um dogma com coisas assim é muito difícil. Impossível.Hoje, os jovens conversam em chats no computador e conectam-se mediante mensagens de texto. É uma época de comunicação?A comunicação é a indústria da palavra vazia. Você pode estar todo o dia teclando e conformar-se com os clichês de ser um adolescente da época de hoje. Antes ocorria o mesmo diante da TV: sempre havia um seriado americano ensinando como comportar-se. Depois de 50 horas de “Sexy and the City”, você aprende como falar com as mulheres, vai ao chat e prova isso com as garotas que estão na Rede e elas, que também viram, sabem como responder. Isso é “comunicação”. É o uso da palavra para não dizer nada que tenha a ver profundamente com você.

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