terça-feira, 28 de abril de 2009

Roma antiga,União Soviética e Estados Unidos.O crepúsculo começa com uma crise interna Por:Luciano Canfora

“Julgando não estarem em condição de se opor aos americanos,alguns preferem se unir a eles. Outros, apesar de odiarem a ideologia que está por trás do Pentágono, optam por apoiar o projeto americano convencidos de que, uma vez posto em ação, conseguirá eliminar as injustiças locais e regionais”. À luz desse diagnóstico, substancialmente exato, Eric Hobsbawm, em seu recentíssimo Imperialismo (Rizzoli, pp. 80, 9) composto de três ensaios muito coerentes entre si, formula uma eficaz e talvez inédita definição do fenômeno mais importante do nosso tempo: “Imperialismo dos direitos humanos”. E fala, inclusive de “coalizão no poder”, reduzida agora a dois únicos sujeitos: os Estados Unidos e a ex-grande potência britânica.Porém, uma tal assunção de “responsabilidade mundial”, da qual se “desmarcou” o ex-fidelíssimo satélite turco, não pode durar muito tempo, afirma Hobsbawn. Por outro lado, os cidadãos dos Estados Unidos gostam cada vez menos do fato de que seu próprio governo mande a economia para o espaço, com o objetivo de manter o papel de polícia planetária. De todo jeito, assinala Hobsbawm – e esse lhe parece o argumento principal – “a única coisa absolutamente certa” é que o império americano também “será transitório como todos os demais impérios”. Para apoiar esta profecia, o historiador inglês aduz o argumento já utilizado por João Paulo II, no mesmo dia em que começava o ataque ao Iraque (abril de 2003), mas censurado por toda a imprensa e por todos os noticiários de maior audiência na Itália e nos demais países, o argumento de que “todos os impérios precedentes tenham caído”. A censura infligida a um pontífice que foi por um tempo o predileto do Ocidente, e segundo o livro de Carl Bernstein (Sua Santidade, Rizzoli) interlocutor direto da CIA na época do Solidarnosc, merece ser lembrada. O ataque ao Iraque foi desencadeado durante o período da Páscoa. Por ocasião da procissão (que se celebra na sexta-feira) durante a qual o Papa, durante um trecho, transporta a cruz sobre seus próprios ombros, ao chegar ao Coliseu – símbolo homicida do imperialismo da Roma antiga – João Paulo II parou e falou com seu habitual vigor profético, acentuado por seu exótico italiano e disse, apontando o horrível edifício: “O império romano também caiu, no fim!”. Poucas horas antes, as bombas “inteligentes” de Bush tinham começado a devastar Bagdá. A alusão era inequívoca. O constrangimento foi tal que somente um noticiário radiofônico um tanto remoto se deu conta daquelas palavras, enquanto os jornais – grandes e não tão grandes – apagaram a frase. Uma avaliação deste tipo pode ser pronunciada ao vivo, em pleno desenvolvimento de um drama histórico – foi o caso de Wojtyla – ou, pelo contrário, com a olímpica soberania do histórico que contempla o decorrer dos séculos ou dos milênios, como no caso de Heródoto, no preâmbulo de suas Histórias.
Heródoto observa serenamente como no inexorável transcorrer do tempo “cidades que eram grandes se tornaram pequenas e vice-versa”. Ele provinha do mundo persa e sabia que Creso tinha acabado arruinado e que Ciro tinha ascendido ao ápice do poder mundial (da época) e também que Xerxes tinha perdido sua “grande armada” ao se deparar com a inteligência e a frota da “pequena” Atenas. E enquanto escrevia estas palavras, já via delinear-se a decadência de outro império, aquele que Atenas tinha construído precisamente a partir da vitória contra os persas, que mais tarde se transformou, como bem sabia Tucídides, em “tirania”. Nessas páginas, Hobsbawm fala da mesma maneira que Heródoto e prevê o fim da atual e guerreira pax americana (muito mais guerreira que a pax augusta), recordando a hecatombe dos impérios coloniais e não coloniais que pontuaram a história do século XX. Mas não terá sido demasiadamente indulgente o “grande ancião” da historiografía européia, com relação ao critério fascinante, indispensável mas também insidioso da analogia? Categoria ou “forma a priori” do conhecimento histórico, a analogia tem, talvez, o perigo de embaçar a necessária vigilância do histórico, que tende, ao contrário, a assinalar as diferenças. Tratemos de olhar, portanto, as diferenças. Em muitos aspectos, o caso dos Estados Unidos é único, com respeito a todos os impérios conhecidos, pelo menos por uma razão não secundária. Todos os demais impérios foram territorialmente vulneráveis, os Estados Unidos o são muito menos, ou talvez não o sejam em absoluto.
Aos gregos lhes parecia inalcançável o império persa, que depois do descalabro de Salamina se tinha convertido no verdadeiro regente (como recorda Demóstenes com cru realismo) da política grega. Todavia, Felipe e sobretudo Alexandre, seu filho, demostraram que podia ser atacado em profundidade e cair em poucos anos. Roma, apesar de sua habilidade de cooptar as elites dos povos conquistados e apesar do sistema defensivo-ofensivo do limes [N. do T.: os limites do Império Romano em seu momento de máxima extensão, no fim da era republicana] foi presa e teve que se misturar profundamente com os transbordantes e conquistadores “bárbaros”. E a lista poderia continuar até o império britânico, cujo fim não foi mais que retardado no ano de 1918 e depois em 1941, e até o soviético, cujos mísseis de longuíssimo alcance apontados para além do Oceano se tornaram inúteis com a implosão do sistema.Diferentemente dos demais impérios, os Estados Unidos são também um continente, já que o controle da América Latina não será previsivelmente alterado nem por Lula nem por Chávez. Além disso, os Estados Unidos ainda detêm um controle “militar” sobre o preço das matérias-primas mundiais. Finalmente, não podem sofrer ataques eficazes nem de exércitos invasores nem de terroristas. É emblemática a nulidade, em âmbito militar, do 11 de setembro, e significativa, ao contrário, a capacidade demostrada pelos Estados Unidos de se aproveitarem politicamente do pânico derivado do mesmo. Obviamente, é muito arriscado lançar profecias depois da hecatombe das profecias histórico-políticas produzidas durante o século XX. A menos inverossímil é, talvez, a formulada por Toynbee no longínquo 1952, quando colocou à luz que o império de Roma tinha de desagregado progressivamente porque as classes dirigentes tinham perdido confiança pouco a pouco nos próprios destinos imperiais e se tinham deixado invadir por outras “espiritualidades”. Em resumo, a inversão de tendência virá mais provavelmente de uma crise de fé nos próprios valores por parte de quem está no vértice do império. Por agora, parece que esse grupo dirigente parece ter feito sua uma interessante variante da versão mais radical da ideologia adversária, a da “revolução permanente”, ou se quisermos, da “exportação do socialismo” (hoje do ocidentalismo), falida muito depressa e arquivada definitivamente pela hipótese de troca do “socialismo em um só país”. Quando se apagará o “fundamentalismo ocidentalista” que hoje domina a parte mais forte e agressiva do Ocidente, se começará a compreender que as diferentes partes do planeta poderão conviver somente se a elas será permitido viver segundo a “iuxta propia principia”.

Um comentário:

  1. eu achei interessante pois e comunicativo para os ouvintes e prar o publico,continuem assim na graça de Deus.

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