quarta-feira, 29 de abril de 2009

Gabriele Veneziano

A teoria das supercordas, que se propõe a unificar a física toda, conciliando a relatividade geral com a mecânica quântica, pode guardar grandes surpresas para o estudo da evolução do Universo.É o que sugere Gabriele Veneziano, físico do Cern (laboratório acelerador de partículas europeu) que foi um dos precursores da idéia de que a idéia de que todas as forças e partículas do mundo são na verdade feitas de pequenas cordas vibrantes, existentes num cosmos com várias dimensões escondidas, além das quatro conhecidas (três espaciais e uma temporal).- A teoria de cordas foi a vedete da conferência. Quando se começou esse campo, havia muitas críticas sobre teoria, de quão distante da realidade ela parecia estar. Hoje, o sr. acha que há consenso?Veneziano - Acho que você está falando da nova teoria de cordas, não da que eu estava trabalhando nos velhos tempos. Veja, quando eu comecei a trabalhar em teoria de cordas no final dos anos 1960 e começo dos anos 1970, essa era uma teoria para as interações fortes, interações nucleares, e lá houve testes experimentais da teoria, que foram tão severos que em algum ponto tivemos de aceitar que isso não era correto para interações fortes, em lugar de uma teoria chamada cromodinâmica quântica, que era a teoria correta, com quarks e confinamentos...- Mas então essas idéias voltaram, com uma cara nova.Veneziano - Vieram com uma cara nova. Embora as cordas não fossem boas para descrever o mundo da física nuclear, elas foram usadas em vez disso para descrever a gravitação. Essa é a nova revolução. No entanto, o preço que você tem de pagar por essa revolução é que o tamanho tem de ser reduzido, do que costumava ser o tamanho do núcleo para algo 20 ordens de magnitude menor. Então, as novas cordas são tão pequenas que é difícil ver seus efeitos. Exceto em situações extremas. Uma é a evaporação de buracos negros.
E outra é a cosmologia. É nas teorias do Big Bang e do nascimento do Universo que eu acho que a teoria de cordas tem algo importante a dizer.- Podemos pescar algumas das evidências das cordas em pesquisas sobre o Universo primordial?Veneziano - Sim, é nisso que estivemos trabalhando. Uma possibilidade seria pela detecção do fundo estocástico de ondas gravitacionais. As ondas gravitacionais permeiam o espaço como o fundo cósmico de microondas [sinal eletromagnético criado durante a expansão inicial do Universo], então, uma das previsões da teoria de cordas é a de que a detectabilidade dessas ondas depende de alguns parâmetros que nós não conseguimos computar com precisão agora. Então, se você vir algo, pode ser algo muito, muito interessante. Se você não vir, pode ser um problema da sensibilidade -não seria uma refutação da teoria.- Não é um problema sempre colocar limites máximos, mas nunca refutar a teoria? Como o sr. se sente a respeito disso?Veneziano - Eu me sinto bem mal. (Risos.) Essa é uma conseqüência do fato de que nosso controle presente da teoria de cordas não é muito bom. Então, no momento, você não pode fazer predições muito específicas. Claro, não estamos felizes com isso. Em 1984, quando a revolução das supercordas apareceu, as pessoas estavam esperançosas de que em 10, 20 anos elas teriam resolvido todos esses problemas. Não aconteceu. Por outro lado, é preciso lembrar que a teoria de cordas, a nova, tem apenas 20 anos. E levou 40 anos antes que pudéssemos transformar a teoria quântica, que estava pronta nos anos 1930, no Modelo Padrão. Então, eu não ficaria surpreso se, para fazer o "Modelo Padrão de Cordas", fosse preciso mais 20 anos.- Quando o sr. acha que teremos alguma evidência que apóie a idéia das supercordas?Veneziano - Eu não sei. Por exemplo, a primeira palestra desta conferência, do professor [George] Smoot, era sobre a possibilidade de que cordas fundamentais fossem tão grandes, escalas cosmológicas, que poderiam ser detectadas. Meu palpite favorito é que isso virá da cosmologia. Mas isso só quando tivermos entendido o que substitui o Big Bang na cosmologia. Eu tenho meu próprio palpite de que o Big Bang não deve ser o começo do tempo na teoria de cordas, de que deve haver uma evolução do Universo antes do Big Bang e de que podemos ver características observáveis dessa evolução.- No início do século 20, os cientistas que fizeram as bases da física quântica achavam que suas idéias eram artifícios matemáticos, não uma descrição correta da realidade. Nesse sentido, o sr. acha que os físicos de cordas são mais aventureiros?Veneziano - Eu não sei a resposta exata à sua pergunta. É verdade que algumas dessas construções de teoria de cordas são pouco convincentes. Li uma coisa interessante num artigo, do [Freeman] Dyson, em que ele dizia que, quando era jovem, a velha geração, como Einstein, Heisenberg, tinha sido muito revolucionária, e a nova geração, como ele e [Richard] Feynman, era mais conservadora. E ele disse que hoje é o contrário. A nova geração parece ser muito revolucionária, e a velha geração é bem conservadora.- E como o sr. se sente a respeito da competição interna no campo, com tantas versões da teoria?Veneziano - Por causa da falta de conexão com os experimentos, as teorias podem ir em todas as direções. Mas eu não sou contra o fato de que a comunidade de cordas esteja explorando muitas possibilidades diferentes. Na verdade, acho que eles se concentram em muito poucos problemas. Há algumas modas, e a maioria das pessoas, em especial as mais jovens, têm de seguir a moda.- A maior razão pela qual os entusiastas defendem as supercordas é esse potencial de unificar todas as forças da natureza. O sr. pessoalmente poderia viver num Universo em que não há unificação?Veneziano - (Risos.) Bem, há dois tipos de unificação. Uma sem a qual eu viveria fácil, uma que seria mais difícil. Uma é quando muitas das pessoas que falam de unificação dizem que todas as forças da natureza viram a mesma coisa em uma certa energia e distância. É um jogo que já foi tentado para juntar as interações fracas, fortes e eletromagnéticas em alguma distância ou energia particular. Então, os teóricos das cordas podem até dizer, bem, essas três forças já podem ser a mesma coisa, mas a gravidade também precisa se juntar. Isso seria esteticamente legal, mas eu não ficaria chocado se a natureza não tivesse escolhido unificar as forças nesse sentido. O que eu acho mais difícil é desistir da idéia de que deve haver um arcabouço teórico para descrever todas as forças da natureza. Sem cordas, nós sabemos como aplicar a mecânica quântica a forças não-gravitacionais, mas não sabemos como fazer isso com forças gravitacionais. Algumas pessoas, como Dyson, defendem que poderíamos viver com a idéia de que a gravidade é clássica. Esqueça o gráviton. Essa não é uma idéia de que eu goste muito. Você vê, por exemplo, nessa palestra que teve com as equações de Einstein sendo tratadas como você trata a matéria num nível quântico. Aí as equações de Einstein parecem clássicas no lado esquerdo e de mecânica quântica no outro lado. Isso pode, de algum modo, ser uma aproximação muito boa. Mas, como o fim da história, eu não gosto.



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