quarta-feira, 29 de abril de 2009

Colin McGinn

Mesmo os nossos conceitos mais básicos não são claros para nós; usamo-los sem grandes problemas, mas não temos qualquer compreensão articulada do que envolvem. É aqui que a filosofia entra. E isto mostra que é um erro pensar que todas as questões genuínas são científicas ou empíricas. Na verdade, a própria ciência levanta problemas filosóficos. O mesmo acontece com a literatura, a história, a economia, as ciências da computação, a matemática e assim por diante. Na matemática, por exemplo, há a questão de saber de onde vieram os números: será que são apenas marcas num papel, ou ideias na mente dos matemáticos? Será que são, como Platão pensava, entidades objectivas e independentes da mente que existem fora do espaço e do tempo? Nada daquilo que aprendemos numa aula normal de matemática nos pode dar a preparação necessária para responder a tais perguntas (apesar de os nossos professores de matemática poderem ter as suas ideias filosóficas sobre estas questões). Nas ciências empíricas, as teorias são criadas para explicar os dados que foram observados, e consideramos muitas vezes que estas teorias fornecem descrições correctas da realidade. Mas note-se que esta caracterização banal da ciência usa vários conceitos que precisam urgentemente de ser elucidados: o que é uma teoria? O que é uma explicação? O que distingue uma observação da teoria usada para a explicar? O que é a verdade? O que é a realidade? A ciência opera com estes conceitos, mas não tem recursos para os explicar. O mesmo acontece com as ciências sociais: também usam os conceitos que acabámos de referir, mas também invocam conceitos como o de razão ou motivo, assim como conceitos normativos como o de correcto e obrigatório — e estes conduzem-nos à filosofia moral e política, assim como à filosofia da mente.
As artes empregam conceitos estéticos como os de beleza e representação, que levantam questões filosóficas: é a beleza subjectiva ou objectiva? Será que toda a representação artística é fundamentalmente do mesmo tipo? O que determina o valor estético de uma obra de arte? Depois há os conceitos extremamente gerais que surgem de súbito em todo o lado — tempo, causalidade, necessidade, existência, objecto, propriedade, identidade. Nenhuma disciplina científica nos pode dizer o que estes conceitos envolvem porque são pressupostos por quaisquer destas disciplinas; precisamos da filosofia para compreender estes conceitos. Por exemplo: é a causalidade simplesmente uma questão de simples conjunção constante de acontecimentos — de "um raio de coisa que se segue a outra", como A. J. Ayer costumava dizer — ou será que envolve um elemento de conexão necessária? E que tipo de necessidade poderá ser? Será qualquer coisa como a verdade necessária de "os solteiros não são casados"?Estas são as perguntas que os seres humanos fazem naturalmente e acerca das quais têm estados perplexos desde que se registou pela primeira vez o pensamento articulado. As crianças fazem perguntas filosóficas espontaneamente, para grande frustração de seus pais — uma vez que os pais estão muitas vezes tão filosoficamente perdidos como os seus filhos. O filósofo é apenas alguém com interesses particularmente fortes sobre estas velhas questões universais; é a encarnação de um género de curiosidade humana — o género que procura o geral, e não o particular, que procura o abstracto e não o concreto. Claro que é fácil ficar impaciente com estas questões, pois não admitem resolução científica. Mas na verdade esta é uma resposta de filisteu combinada com fetiche científico. A ciência é sem dúvida uma tarefa importante e nobre, mas não é a única forma de investigação intelectual com valor. Não devemos abraçar a ideia de que uma pergunta ou é científica ou coisa nenhuma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário